sábado, 26 de maio de 2012


As portas já abriram para o segundo dia do Rock in Rio. Depois da passagem dos maiores nomes do metal no primeiro dia, hoje esperam-se 80 mil pessoas. Com os Linkin Park, Limp Bizkit, The Offspring e Smashing Pumpkins no palco principal , promete ser um dia forte, cheio de bons concertos e surpresas.
No palco Sunset continuam com a grandes bandas, destaco os portugues Xutos e Pontapés, Titãs e Rita RedShoes.
A animação continuará pela noite fora na tenda electrónica com os canadianos AZARI & III a encerrarem a primeira parte deste festival.
Quem vem á Cidade do Rock Hoje?
Eu Vou e Vocês?
Com 5 álbuns editados e sendo a quinta vez que actuam em Portugal, estava tudo a postos para mais um grande concerto dos Mastodon que marcam presença pela segunda vez este ano em Lisboa. Apresentaram o seu último álbum The Hunter e mostraram muita dedicação ao público.
Muito heavy metal, guitarradas e vozes loucas, deram um grande espectáculo ao pôr-do-sol, focado no último trabalho.
Um concerto curto mas muito intenso que não desiludiu os fãs de Mastodon...
Os Metallica foram os últimos a actuar no palco mundo perante uma plateia cheia. Na Bagagem traziam o Black Album e com vozes e guitarras afinadas deram um espectáculo de duas horas de sucessos.
A banda sentia-se confortável no palco, adoram Lisboa,e Ela os Metallica, com clássicos como "The Unforgiven" e "Enter Sandman" levaram os fãs ao rubro, mesmo na famosa balada "Nothing Else Matters" a multidão gritava em plenos pulmões!
Com direito a fogo-de-artificio e bolas saltitonas gigantes nada os fazia abandonar o palco e dedicando a última música à "família Metallica portuguesa" fizeram um adeus sentido e demorado!
Um concerto monstroso, cheio de energia a que já fomos habituados!
Com um público a crescer, os Evanescence subiram ao palco principal para apresentar o terceiro álbum homónimo. Pela voz magnífica de Amy Lee, superaram todas espectativas dos fãs.Com clássicos do álbum Fallen, como Lithium e My Immortal encantaram a plateia que num coro desafinado mas entusiasmante tentaram acompanhar a Diva do metal.
Finalizaram com a Bring Me To Life, o que levou os espectadores ao rubro. Um concerto cheio de sucessos e com um som bem mais pesado do que o habitual.
Esperemos que nao demorem mais oito anos a voltar a Portugal!
A banda brasileira Sepultura apresentou-se no 1ºdia do Rock In Rio com os franceses Thambours Du Bronx.
Com milhares de fãs a assistirem, abriram o palco Mundo mostrando todo o poder do metal. Apresentaram o seu último álbum Kairos, juntamente com os tambores frenéticos dos seus convidados. 
Vista por muitos como a banda brasileira mais bem sucedida a nível internacional, voltaram ao festival para um grande concerto ao som das latas gigantes, contagiando o público com a sua energia.
Com menos de 1h de concerto, provaram que a mistura entre as duas bandas resultou na perfeição, e a prova disso foi a multidão que pulou sem parar...
O palco Sunset foi inaugurado pela banda de Adolfo Luxúria Canibal, os Mão Morta que cativaram o público sedento por música aderindo em massa a este palco.
A eles, juntaram-se Pedro Laginha dos Mundo Cão e o escritor Valter Hugo Mãe que perante uma plateia cheia deram um grande concerto de abertura na lingua de camões.

ROCK IN RIO 2012

O Rock In Rio Lisboa está de volta ao Parque da Bela Vista. Durante 5 dias irão passar inúmeras bandas por este festival, prometendo muito calor, divertimento e principalmente boa música.
Metallica,Stevie Wonder,Ivete Sangalo,Maroon5 e Bruce Springsteen são apenas alguns dos gigantes da música mundial que poderá assistir...
Sol,pessoas,dançar,pular,rir,cantar, grandes concertos e muitas outras atracções...
SEJAM BEM VINDOS À CIDADE DO ROCK!
Eu vou e vocês?

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Zé Pedro

«Sabes quem é que conheci hoje? O Zé Pedro, dos Xutos», disse eu à minha irmã, em conversa ao telefone. «A boa energia que ele transmite... é incrível». Ela concordou: «Sim, é essa a ideia que eu tenho dele». De facto, as boas vibrações, quando genuínas, atravessam qualquer meio - seja a televisão, a rádio, o papel impresso ou o disco. Mas quando temos oportunidade de estar na presença de um músico - e de um homem - como o Zé Pedro, o impacto é mil vezes maior.

Essa oportunidade aconteceu no passado dia 16 de Maio, num encontro organizado pela ETIC e moderado por Rui Miguel Abreu. Os moldes da conversa foram definidos logo aos primeiros minutos: enquanto Rui Miguel Abreu pedia aos presentes para se chegarem mais para a frente, Zé Pedro pegou na mesa que fazia de barreira entre "artista convidado" e "público" e afastou-a para o lado. Neste clima de proximidade, muitas histórias foram contadas: os dias em que começou como jornalista de música, a formação da banda, os altos e baixos num percurso já com 33 anos, até mesmo o nascimento do punk e do grunge.

Mas é da energia deste homem que não me vou esquecer. Zé Pedro sente-se profundamente grato por fazer aquilo que o apaixona e por pertencer à banda mais acarinhada pelos portugueses. Por isso, faz questão de responder pessoalmente ao email de um miúdo de 10 anos, carregado de perguntas para os Xutos. Acredita que a música só faz sentido enquanto processo de dar e receber. «Um músico, quando sobe ao palco, é um fio condutor. Temos de retribuir a energia que estamos a receber do público com o nosso empenho - nem que seja para uma plateia de cinco pessoas. Um artista que não consegue retribuir isso fica tonto, megalómano, egoísta.» Acredita que a arte é saudável quando esse fio condutor se liga também a outros artistas - sejam eles músicos, jovens designers ou profissionais de video.

Recorda-se da primeira coisa em que pensou, quando acordou depois da cirurgia: «em 15 dias ponho-me bom e consigo estar no Optimus Alive». E isto embora os médicos estimassem um recobro de 3 semanas. A paixão alimentou-lhe o corpo e deu-lhe alta, a tempo de subir ao palco do Passeio Marítimo de Algés. Trinta mil pessoas a aplaudirem à sua frente, «um baque» e a emoção que o fez chorar, a si e aos seus colegas.

A dada altura, pedi a sua opinião acerca do estado do jornalismo musical em Portugal. Esperava críticas sobre o que não temos. Recebi elogios sobre o que temos. Perante um copo meio vazio, Zé Pedro vê um copo meio cheio. E eu vejo uma lição de vida.

Crónica: Negócios com o Tempo

Fiquei emocionado quando ouvi os primeiros acordes de "Sete Mares". Aposto que uma larga fatia das pessoas que esgotaram o Coliseu de Lisboa sentiram o mesmo arrepio. Quase 30 anos depois de "Glória", mais de 20 depois dos grandes concertos, a Sétima Legião estava de novo ali, no palco. Sem substitutos livres de rugas ou cabelos grisalhos. Era mesmo a formação original da banda.

Na noite de sexta-feira, o Coliseu transformou-se em máquina do tempo para toda uma geração que viveu a adolescência nos anos 80. Até para aqueles que eram catraios, mas que, como eu, têm irmãos mais velhos que lhes despertaram o gosto pela música pop e para quem o Top Disco era tão importante como os desenhos animados. O que me levou a concluir: é tramado estar na casa dos 30 e ter a música como a paixão mais antiga. Porque se já estivesse nos 40, muito provavelmente teria assistido à glória da Sétima Legião no Pavilhão Carlos Lopes. Teria sido quase certo um lugar nas primeiras filas do Estádio José Alvalade, a ver David Bowie. Teria rumado a Madrid ou Barcelona e sido esmagado pela monumental Blond Ambition Tour de Madonna. Só que em 1990, ano em que se situam os ditos casos, os meus 13 anos não permitiram tamanhas aventuras. É tramado.

Enquanto a banda de Pedro Oliveira e Rodrigo Leão tocava a sua música e na nossa memória, dei por mim a accionar a imaginação. «Se soubesse o que sei hoje...» e pudesse negociar com o Tempo, estaria entre os que testemunharam o pulsar dançante e revolucionário dos Heróis do Mar, quando em 81 se estrearam no Rock Rendez-Vous. Seria até um nadinha mais ambicioso e rumaria à Londres de 79, para assistir à mítica (e única) digressão de Kate Bush. E não me perdoaria se perdesse a viagem até Nova Iorque, para transpirar na pista no Paradise Garage, com Lerry Levan ali mesmo, na cabine do DJ. Não fui mais atrás, para não trair o sentimento de pertença - neste exercício de evasão vale tudo até 77, ano em que passei a fazer parte desta realidade.

Pois a julgar pelo que aconteceu no mês passado em Coachella, caminhamos a passos largos para converter estes voos - da lembrança ou da imaginação - em coisas "reais". Durante a actuação de Snoop Dogg e Dr. Dre, surgiu em palco um convidado especial: nada mais que Tupac Shakur, o rapper cujo assassinato deixou consternada a comunidade hip hop, corria o ano de 96. Obviamente, era um holograma, mas a audiência ficou algures entre a perplexidade e a comoção. É dado assente que a memória e a "retro-mania" alimentam todo um negócio, que começou de mansinho nas compilações e estações de rádio temáticas. Tornou-se mais engenhoso e invadiu as salas de espectáculo - não foi há muito tempo que o Atlântico recebeu Kim Wilde, os ABC, Nik Kershaw e Belinda Carlisle, todos na mesma noite, num pack nostálgico com o rótulo “Here And Now”. Até aqui, tudo bem. Mas agora, começa a entrar no domínio do bizarro: o negócio da memória quer acordar os mortos.

Diz-se por aí que Tupac, o holograma humano, vai entrar em digressão pelos Estados Unidos. Que é o mesmo que dizer: já vamos poder pagar para ver palcos vazios. Daqui até termos James Brown ou Elvis a dançar na nossa sala, vai um pulinho. É esquisito demais para a minha cabeça. Prefiro a verdade 2D de uma imagem de arquivo. Ou os meus voos imaginários. Ou os Sétima Legião com rugas e cabelos grisalhos, a presentearem-nos com a sua real magia, no palco do Coliseu. Isto sim, pode causar-me arrepios.

Rui Clemente, Maio de 2012

O Dia Em Que Quase Chorei Com O Zé Pedro

A altura de Zé Pedro dos Xutos & Pontapés é, para mim e desde sempre, resultado de uma perspectiva oblíqua. Literalmente. Literalmente, porque ao vivo tive sempre de inclinar um pouco a cabeça para o ver, em cima de palco.
A altura de Zé Pedro dos Xutos & Pontapés é, para mim e desde sempre, a altura de uma estrela rock. A maior de Portugal e a que o país soube fazer, e muito bem – sublinhe-se. Porém, a sua altura, enquanto estrela rock, nunca foi desfocada na minha visão. Passo a explicar. Nunca senti, nestes 22 anos que levo, que Zé Pedro usufruísse do status daquela estrela de rock que todos imaginamos, longínqua e inalcançável. Cedo percebi, como todos os outros «putos» que o idolatram, que ele é uma pessoa comum. As provas são mais que muitas: desde ser considerado “o gajo mais porreiro do rock português”, que abraça as velhas e as novas gerações – de capitães faustos e pontos negros –, até ao facto de no ano passado ter pago pelos excessos, de drogas e de álcool. Ele é, afinal de contas, mortal como eu, como todos nós. A minha imagem de Zé Pedro nunca foi desfocada porque são muitos os exemplos de humanidade na sua vida: ele foi jornalista musical (“e esta, hein?”), tal como pretendo ser; ele é ainda um inocente sonhador no mundo da música, que deseja poder chegar aos 50 anos de Xutos tal como os Rolling Stones; ele já foi abalado pela morte de uma pessoa querida, Marta Ferreira, irmã de Kalu e manager da banda, desaparecida em 2007; ele é radialista e tem um programa na Radar; ele gosta apaixonadamente de música - sabe, por exemplo, como se construiu e congeminou o punk e o grunge. Enfim, ele é humano como eu, como todos nós.
A altura de Zé Pedro dos Xutos & Pontapés é, para mim e desde sempre, tão profundamente humana que hoje, dia 16 de Maio de 2012, tive a oportunidade de o cumprimentar, de falar com ele e de poder tirar uma foto – da praxe – a seu lado, numa palestra organizada pela ETIC. E, numa sala em que poucos centímetros nos separavam, quase chorei por ver os seus olhos brilharem de emoção quando relatou às pessoas que ali se encontravam, mas de olhos postos nos meus, um dos episódios mais marcantes na sua vida. Um episódio em que Zé Pedro, o músico, pagou pelos seus vícios. Um episódio em que Zé Pedro, a pessoa, teve de receber um transplante de fígado. Um episódio em que Zé Pedro, fã de música, quis muito recuperar do transplante a tempo de poder tocar no festival Optimus Alive, em Julho do ano passado, e assim poder partilhar os bastidores com Iggy Pop, um dos seus ídolos. Um episódio em que Zé Pedro, um comum mortal como qualquer um de nós, chorou assim que subiu ao palco e foi recebido com os aplausos de mais de 30 mil pessoas. Aplausos de boas-vindas, de alívio e aplausos pelo seu regresso ao combate.
A altura de Zé Pedro dos Xutos & Pontapés é, para mim e desde sempre, mundana. Embora a sua banda já conte 33 anos, embora ele já conte com 55 e embora faça parte da maior banda de rock em Portugal, Zé Pedro não tem tiques nem desejos de estrela de rock. Zé Pedro não é arrogante ou antipático. Zé Pedro não padece da doença do sucesso. Zé Pedro não é Keith Richards dos Rolling Stones – o seu ídolo de sempre. Zé Pedro é Zé Pedro, o “gajo mais porreiro do rock ‘n’ rol português” e muito provavelmente do mundo.
A altura de Zé Pedro dos Xutos & Pontapés é, para mim e desde sempre, de pura admiração.
A altura de Zé Pedro dos Xutos & Pontapés é, para mim e na verdade, a mesma que a minha.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Apontamento: X-Wife - 10 Anos 10 Singles

The Vicious Five, Loto, Plaza, Post-Hit ou You Should Go Ahead são alguns dos nomes nacionais que se destacaram na altura em que os X-Wife do Porto surgiram. Infelizmente, todos os primeiros nomes enumerados já cessaram actividades ou desapareceram do mapa musical português, restando só o último. The Strokes, The Rapture, LCD Soundsystem, Bloc Party ou The Killers são os nomes internacionais nos quais os X-Wife se podem rever. No entanto, para além de terem nascido na mesma época - e até um pouco antes -, apontar a banda de João Vieira, Rui Maia e Fernando Sousa como uma cópia destes nomes é errado. Muitas vezes, os X-Wife são bem melhores do que os 'originais' que lhes são apontados e o único 'problema' será o local de nascimento que está no BI da banda. Mas esqueça-se tal facto. Dez anos depois, é Lisboa o local de celebração da primeira década do grupo e o público atendeu ao seu apelo. Ninguém resistiu à oportunidade de poder dançar com a ex-mulher e houve quem quisesse selar segundo casamento, ou melhor desejar mais dez anos com X-Wife. E foram originalmente melhores que os originais.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Crítica: Julia Holter - "Ekstasis"


Julia Holter
Ekstasis
Rvng Intl.

Existem álbuns que ganham vida própria, que existem num outro plano de realidade onde a música que tocam ganha forma, corpo, alma. Em Tragedy, o primeiro álbum a sério de Julia Holter, ela faz um apelo com "Try To Make Yourself A Work Of Art". A cantora multi-instrumentista pegou nas suas palavras e concretizou-as em Ekstasis.

Numa primeira audição, a música de Holter move o chão que pisamos, não sabemos onde estamos. Ouvimos um sem número de barulhos. A água a correr, o vento, nuvens. Um conjunto de sons, muitos difíceis de identificar à partida, outros para sempre perdidos na música. O disco volta ao início, a viagem recomeça, acaba. Começamos a perceber os contornos. Afinal há chão, há paredes e há tecto. Ekstasisé uma casa de vários quartos, alguns de jazz, música clássica, ambiente, étnica, electrónica. É um álbum de reflexões pop.

10/10

Crítica: Moonface - "With Siinai: Heartbreaking Bravery"


Moonface
With Siinai: Heartbreaking Bravery
Jagjaguwar

É difícil saber de cor todo o portfólio de Krug Spencer: Wolf Parade, Sunset Rubdown, Swan Lake, Fifths of Seven, Frog Eyes e, presentemente, Moonface, a sua última manifestação musical - diz ele. Já ouvimos Dreamland EP: marimba and shit-drums, já ouvimos Organ Music Not Vibraphone Like I'd Hoped e agora ouvimos With Siinai: Heartbreaking Bravery.

Com Siinai, uma banda de krautrock finlandesa, o músico canadiano nunca esteve tão distante da terra a que pertence e nunca esteve tão em casa. Krug Spencer dá a voz, Siinai coloca-a no éter. Não é uma colaboração disparatada. A escrita esquizofrénica de Spencer está menos críptica, mas não menos eloquente. A tristeza, a melancolia, a solidão, a violência das palavras ecoam tão forte como os instrumentos tocados por Siinai.

Gravado no gelado país europeu, esta terceira encarnação de Moonface é calorosa. O nome do álbum é directo e conciso como o tema que lhe dá fogo. São músicas de amor, ou a ausência dele, que nos fazem bater o coração a diferentes velocidades desde a primeira à última faixa. 

8,5/10

Crítica: The Magnetic Fields - "Love at the Bottom of the Sea"


The Magnetic Fields
Love at the Bottom of the Sea
Merge

Quem o conhece sabe que Stephin Merrit não é notório pela sua simpatia, mas o que escreve sim. O humor distorcido do cantor autor norte-americano está de volta. A seu lado, Claudia Gonson e o resto da banda, ou não fossem eles The Magnetic Fields.

As saudades já se faziam sentir, por isso o décimo-primeiro álbum da banda volta aos sintetizadores que nos primeiros anos de vida deram som à banda. Voltamos também aos dois minutos por faixa de 69 Love Songs. É um álbum de regressos, parece que voltámos aos anos noventa. À partida parece ser a fórmula perfeita para ultrapassar o teste do tempo. "Andrew in Drag", o primeiro single, mostra-se tão difícil de sair dos ouvidos como tirar o sorriso da cara após o ouvir. É bom, muito bom, mas sabe a pouco. É esse o problema existencial de Love at The Bottom of The Sea. A curta duração das músicas deixa-nos a pedir por mais, a genialidade de algumas coloca outras menos brilhantes à sombra. Soaria muito melhor se tivesse precedido 69 Love Songs, mas infelizmente a data na capa refere 2012. Stephin, queremos mais.

7/10

Crítica: Spoek Mathambo - "Father Creeper"


Nthato Mokgata é Spoek Mathambo, Spoek Mathambo é Father Creeper. O que é Father Creeper? Trata-se do segundo álbum do músico africano, um misturar de géneros que se ligam entre si por uma camada orgânica que pulsa ao seu próprio ritmo. África é o que se respira em todas as músicas, continente de uma riqueza imensurável, é o que bombeia os diamantes de sangue de que fala Spoek Mathambo. Contudo, tal como a terra que lhe dá fôlego, é um álbum de dimensões colossais, é um cenário de guerra. Facilmente somos apanhados desprevinidos pelos danos colaterais das explosões sonoras criadas pelo batalhar entre o dub-step e o rock, o hip-hop e o electro, o reggae e o post-punk.

Torna-se difícil caminhar - em cada faixa uma mina de som espera-nos. Não é acaso que tenha sido lançado por uma das editoras naturais da terra do grunge, a Sub-Pop. Alto, corrosivo e agreste, tanto liricamente como sonoramente. Afinal de contas não é disto que o grunge se faz?

Crónica: Sétima Legião

São 21h45, as luzes apagam-se e o Coliseu enche-se de som - os Sétima Legião entram em palco. Há quarenta e cinco minutos ainda a sala de espectáculos, vazia, aguardava pelo público que começava a dificultar a passagem aos que simplesmente passeavam pela Rua das Portas de Santo Antão. Comecei a notar um padrão na fila de entrada para o concerto. Não foi necessário um grande poder de observação. Eu era, provavelmente, uma das pessoas mais novas que ali estava.

Seria mentira não associar a longevidade da banda à longevidade de quem a ouve. Eu era o mais novo e, como se isso não bastasse, também possivelmente o único que não tinha os êxitos a tentarem fugir-me da boca antes de me entrarem pelos ouvidos. "Com certeza que os conheces, mesmo sem teres consciência disso." diziam-me enquanto tentavam cantarolar algumas dessas mesmas músicas. Eu acenava que sim, uma leve sensação familiar despertava.

As filas adensavam-se, lia-se "esgotado" nos vários posters à entrada do Coliseu e aquele sussurar de vozes antes de um concerto crescia e crescia. A hora que marcava a reunião dos Sétima Legião ganhava ímpeto.

"Suba pela direita, o seu lugar é no terceiro andar, camarote trinta." Assim o fiz. Subi pela direita, degrau a degrau até ao terceiro andar, camarote 30. Olhei para cima, olhei para baixo, cadeiras. Foi a minha segunda surpresa, tendo sido a primeira o "esgotado". Poucos foram os concertos sentados a que assisti no Coliseu (na verdade, só um), e os meus vinte e três anos já tiveram em mãos um considerável número de bilhetes para a sala Lisboeta. "Isto é um concerto sério.", pensei eu.

São 21h45, as luzes apagam-se e o Coliseu enche-se de som - os Sétima Legião entram em palco. Palmas, gritos, assobios ouvem-se quinze minutos após a hora assinalada nos bilhetes, para logo de seguida darem lugar a "Baile das Sete Partidas". A partir daí fez-se, não, tocou-se história. Percebi de imediato que não conhecendo a banda, conhecia-a. Cravadas no inconsciente estavam músicas como "Noutro Lugar", "Sem Ter Quem Amar", "Sete Mares" e "Por Quem Não Esqueci". Não consegui deixar de bater o pé, contagiando a mão direita com um leve bater no joelho, que para a cabeça se alastrou balançando-a.

Foi um concerto de memórias sem lugar, onde a cada música tentava lembrar-me e relembrar-me em que tempo, lugar, as tinha ouvido, com quem e porquê. Olhava em meu redor e via nos outros a mesma sensação nostálgica que os trinta anos de música evocavam.

Não foram os quinze minutos de atraso, não foram os problemas técnicos, muito menos o repetir de "Sete Mares", "Noutro Lugar" e "Por Quem Não Esqueci" que fizeram este concerto menos memorável para os que vêem e ouvem na banda, mais do que um símbolo de portugalidade, memórias. "Isto foi um concerto a sério.", pensei eu. Cumpriu-se a Sétima Legião.

Reportagem: Record Store Day - Flur


A indústria da música evoluiu dramaticamente, desde o fonógrafo cilíndrico de Thomas Edison até ao ubíquo MP3. Cada vez mais a música escreve-se em zeros e uns, vende-se em zeros e uns, toca-se em zeros e uns, mas a música é muito mais do que esta linguagem binária. Talvez por receio da mudança para uma era em que tudo se transcreve para o digital, talvez apenas pelo som nostálgico da agulha a deslizar pelo álbum que roda no gira-discos, surge o Record Store Day - o nome dado à celebração da música enquanto formato físico e à sua distribuição num comércio mais tradicional.

O que começou por ser uma iniciativa americana rapidamente se fez ouvir pelo resto do mundo. E fez-se ouvir com eventos especiais, concertos, encontros entre músicos e fãs, e, provavelmente, com o que mais nos deliciamos, os lançamentos e as versões dedicadas unicamente ao terceiro sábado de abril. E os descontos, não nos esqueçamos dos descontos.

Este ano contou com lançamentos como a colaboração de Feist com Mastodon:Feistodon; St. Vincent: Krokodil b/w Grot; Arcade Fire: Sprawl II; Animal Collective:Transverse Temporal Gyrus; Beach House: Lazuli b/w Equal Mind; The Flaming Lips And Heady Fwends; entre tantos, tantos outros que contaram também - e é aqui que somos levados à nossa loja de música independente favorita de Portugal - com Lisbon Bass.

A compilação com distribuição em Portugal exclusiva pela Flur teve lançamento, justamente, a 21 de abril. Nascido na Holanda às mãos do MC D-Mars, o antigo membro dos Micro montou um electrizante puzzle da cena Bass Lisboeta. Catorze é o número de peças: Photonz, Roulet, Octa Push, Infestus e Deestant Rockers são alguns dos autores dessas peças que no seu todo encaixam os beats quebrados tanto entre influências africanas, como britânicas.

A presença de Lisbon Bass, com desconto de lançamento, nos expositores da loja independente de Santa Apolónia esteve acompanhada por Tó Trips e um showcase da editora lisboeta Cafetra. Os primeiros acordes ao vivo deram-se por volta das já marcadas 16h15 num line up em folhas A4 coladas pelas paredes da loja. Rapidamente se formou uma meia lua de pessoas no final da loja enquanto Tó Trips, sentado e com a guitarra em punhos, nos dava as boas vindas a mais um Record Store Day.


O dia da música começou.

Às 16h45 a música tocava tanto para o Tejo como para nós, sendo nós a esplanada do restaurante vizinho da Flur e ainda o mais diverso público que se aglomerava na parte de trás dos armazéns do Cais da Pedra. O showcase da Cafetra dá-nos música com um rapaz loiro, de cabelos encaracolados, ao microfone. De voz trémula e esganiçada, 100 Leio tocava sozinho para um público divido entre a turma da Cafetra, os curiosos que por ali passavam e os sempre presentes amantes de música.

Paralelamente aos concertos, os discos da Flur passavam de mão em mão, de olho em olho  e de ouvido em ouvido. Ao balcão estava o já simpático José Moura, que com simpatia acrescida cumprimentava quem entrava na loja. A seu lado dispunha de dois gira-discos dos quais as pessoas se serviam para picar o que encontravam nas recheadas prateleiras. "Existem sempre surpresas atrás de surpresas, um bom disco atrás de uma boa capa, uma boa capa à frente de um bom disco", ouvia-se várias vezes por palavras diferentes enquanto solenemente procurávamos também por qualquer surpresa digna de se fazer pagar. Viramos a cabeça para o lado e está um rapaz com o olhar fixado num dos nossos álbuns favoritos deste ano. Não conseguimos resistir uma troca de palavras.

Etic: "Uh… Olá. Não pude deixar de reparar que estás a ver o Ekstasis da Julia Holter."
Rapaz: "Sim, gosto muito da Julia. É um álbum fenomenal."
Etic: "E o que te trás à Flur num dia como este? E estou a referir-me ao Record Store Day, não ao tempo… (risos)".
Rapaz: "(Mais risos) Venho essencialmente ver, e ouvir o que se passa, as novidades, as não novidades, os descontos."
Etic: "És um caça descontos?"
Rapaz: "Não sou caçador profissional, mas todos gostamos de preços mais interessantes. Agora mais do que nunca."
Etic: "Isso quer dizer que és um comprador de música, ou um "comprador de música"?"
Rapaz: "Todos "compramos música", mas… Não gosto nada dessas coisas do digital, hoje em dia as pessoas esquecem-se um bocado de que a música é também um bem material, não apenas uma manifestação virtual, mas algo que é criado com objectos e pessoas reais, quando assim o é, claro. Comprar o vinil, ou o álbum é para mim muito importante."
Etic: "És apologista de tê-lo nas mãos."
Rapaz: "Sim, sou apologista de tê-lo nas minhas mãos, gosto de sentir o cheiro, a textura. (risos)."
Etic: "Mas tu és aqui de Lisboa? O teu sotaque…"
Rapaz: "Não, não. Vim passar uma temporada com uns amigos meus e decidi que era uma boa oportunidade passar por aqui."
Etic: "E porque estás cá dentro e não lá fora?"


Por esta altura já se ouvia a voz de João Marcelo como Éme.


Rapaz: "Não vou dizer que adoro e ando sempre à procura de bandas portuguesas, gosto de ser surpreendido, mas… Houve uma altura em que estive colado em Moulinex e Xinobi, mas a onda folk da Cafetra não me diz nada."
Etic: "Está na hora de eu ir espreitar o que se ouve lá fora. Mas diz-me, pensas levar alguma coisa daqui?"
Rapaz: "Sim, sim. Algo com cheiro e textura. (risos) Tenho os olhos postos no EP de Burial."
Etic: "Boas compras, e um bom resto de dia cheio de música. Como te chamas, já agora?"
Luís: "Sou o Luís, prazer."

"Estou com o cabo no sítio errado. Vou passar à segunda." Assim foi o começo de Éme, e assim foi a disposição crescente deste showcase. Nunca tocando mais do que vinte minutos, Go Suck a Fuck, Smiley Face e Pega Monstro deram-nos a provar da música que tocam. Ouvia-se, degustava-se e ou se gostava, ou não se gostava. Após a actuação de cada um, a malta jovem da Cafetra, alguma mais tímida do que outra, deambulava entre a entrada e as traseiras da Flur. O convívio era tão importante como a música, ora não é isso que o Record Store Day é?

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Crítica: Spoek Mathambo - "Father Creeper"

Spoek Mathambo
Father Creeper
Sub Pop

Lentamente, o mundo começa a colocar os olhos na música africana, vista como o filão a explorar no que à música mais dançável diz respeito. A editora Sub Pop, nome para sempre associado ao rock, procura dar um empurrão ao apontar baterias a sonoridades mais electrónicas. Desta vez foi à África do Sul e trouxe Father Creeper, a nova proposta do vanguardista Spoek Mathambo. O seu segundo disco aprensenta-se na forma de uma refrescante mistura de ritmos tradicionalmente africanos, actualizados por via de linguagens como o hip-hop, drum'n'bass e dubstep. Este cocktail é acompanhado por sintetizadores e, aqui e ali, por guitarras bem roqueiras. É um disco feito com o corpo em África, mas com a cabeça num futuro mais próximo do que se julgava. Os sons da revolução vêm de África.

Crítica: Buckethead - "Electric Sea"

Buckethead
Electric Sea
Metastation

Quando falamos da discografia de Buckethead, o termo "extensa" é manifestamente curto. Desde que saiu dos Guns N' Roses o multi-instrumentista tem dado largas à sua criatividade, atingindo uma média de quase quatro álbuns ao ano. Mas não se pode dizer que esteja sempre a fazer o mesmo. Em Electric Sea deixa, mais uma vez, a sua zona de conforto e procura entrar nos mundos da música ambiente, flamenco e música clássica, ao reinterpretar composições de Bach e Catalani. A sequela de Electric Tears, de 2002, torna-se também no primeiro disco de Buckethead que ganha dimensão física desde 2005 - uma bela forma de colocar em evidência uma das incursões mais ousadas da sua carreira. Ora de guitarra acústica, ora de guitarra eléctrica em punho, ora de forma mais ora menos melancólica, foi preenchido mais um espaço do parque de diversões de Brian Carroll. Que nunca se canse de colocar música nos nossos ouvidos.

Crítica: Saint Vitus - "Lillie F-65"

Saint Vitus
Lillie: F-65
Season Of Mist

Dezassete anos depois de Die Healing, com separações/reuniões e mudanças na formação pelo meio, os Saint Vitus regressam finalmente aos discos. A pergunta que se impõe é só uma: valerá a pena regressar aos álbuns numa altura em que o som da banda já não é uma novidade? O calendário indica que estamos em 2012, mas vivemos uma época de adoração dos anos 80 e 90. Porque não dar, também, uma oportunidade à boa música dessas décadas? Lillie F-65 vem provar que os Saint Vitus, para além de pioneiros no doom, continuam a ser, em 2012, uma das melhores bandas dentro desse espectro. Um disco que, não apresentando grandes inovações, resgata o que de melhor a banda fez ao longo da sua encarnação original. A intensidade de temas como "Let Them Fall" e "Blessed Night" vale, desde já, a candidatura a um dos melhores da música pesada do ano. Depois, há ainda "Dependence", um épico de sete minutos que vagueia entre o noise, o doom e o psicadelismo.  "Lento" e "pesado" continuam a ser as palavras de ordem.

Crítica: Joan Osborne - "Bring It On Home"

Joan Osborne
Bring It On Home
ADA Global

A voz de Joan Osborne, só por si, é um argumento de peso para ouvir um disco. Se a ela juntarmos temas clássicos de Ray Charles, Muddy Waters ou Otis Redding, tudo fica ainda mais interessante. Muito mudou na vida de Joan desde o seu mega-hit "One Of Us". Parte integrante dessa mudança foi a tour com os Funk Brothers, músicos de proa da editora Motown. A mudança do registo rock FM e country para os blues e soul mais clássicos apenas destacou o que já lá estava: uma voz divinal. Outra componente de extrema importância em Bring It On Home é a autêntica orquestra por detrás dele. Músicos como Jack Petruzelli (também co-produtor do disco) ou Allen Toussaint, emprestam todo o seu talento a este trabalho e destacam-se em "Roll Like A Big Wheel", pérola obscura que Joan descobriu na sua própria colecção de discos. Provas faltassem e Bring It On Home reforçaria a urgência de escutar com atenção esta voz. Seja o registo blues, R&B ou soul.

domingo, 13 de maio de 2012

Os Pontos Negros
Soba Lobi
Optimus Discos

A premissa do terceiro disco d'Os Pontos Negros é estimulante. Estúdios de Abbey Road, em Londres, onde a banda gravou o álbum e que por si só já conta para nota positiva; e "Senna", a faixa inaugural onde preferem ser um Ayrton Senna em vez de um Michael Schumacher. Esta é a canção central de Soba Lobi. Apontam as guitarras aos "plágios" a que foram sempre colados: The Strokes e The White Stripes, "eu não me chamo Casalancas, eu não me chamo Jack White", e fazem o seu disco mais "punque roque". "Mudam-se o tempo, mudam-se as verdades", defendem-se a seguir em "Três Pregos Num Caixão" e ironicamente convertem-se nuns Ramones de Queluz à terceira prova de fogo. A rápida passagem por Londres acelerou tudo. Para melhor. Para 77.

4/5

Crítica: Chromatics - "Kill For Love"

Chromatics
Kill For Love
Italians Do It Better

Cinco anos depois do aclamado Night Drive, os Chromatics, de Portland, voltam ao centro das atenções na cena independente norte-americana. Post-punk, italo disco e shoegaze, estes foram os géneros aos quais o quarteto piscou o olho nos três discos anteriores. O fio condutor tem sido o revivalismo do post-punk mergulhado no rock independente americano com apontamentos electrónicos e ao quarto disco a synth e a dream pop são as novas paletes de cores a explorar. Kill For Love confirma a promessa deixada pelo disco anterior, no qual despontaram para a cena indie, e sem medos atiram-se a um disco conceptual com mais de 90 minutos. Um trabalho de estúdio e de produção surpreendentes que transformam um possível álbum fatigante numa experiência hipnótica, doce e de salutar, pelo risco que acarreta. Kill For Love tem algumas das mais viciantes canções de 2012.

4/5

Crítica: The Mars Volta - "Noctourniquet"

The Mars Volta
Noctourniquet
Warner

Em ano de regresso dos At The Drive-In, música é coisa que não falta na dupla Omar Rodríguez-López/Cedric Bixler-Zavala. Os Mars Volta já levam pouco mais de dez anos de carreira e discos já se contam seis. É obra. Noctourniquet é um passo firme do grupo num trilho em permanente sobressalto. A banda deixa de lado as composições extensas e encurta parte da sua música, com melhoria nos resultados. No último disco, a perturbação estava a ganhar terreno ao encanto e a sua capacidade sonora estava a perder fôlego. A esquizofrenia continua a ser parte essencial no som dos Mars Volta, a letras continuam indecifráveis e os títulos intimidantes, mas o ganho vem da pausa anterior a este álbum. Mostram agora uma nova face, mais lenta e menos abrasiva, que respira bem. O prog-rock dos esquisitos Mars Volta sobrevive, novamente.

4/5

Crítica: David Fonseca - "Seasons: Rising"

David Fonseca
Seasons: Rising
Universal

David Fonseca já é prata da casa. Cinco discos a solo mostram que “Little David Boy” é já um homem, com aquele sotaque peculiar, mas familiar. Seasons: Rising é o primeiro de dois álbuns de David este ano que relatam 365 dias da sua vida. A fórmula é conhecida, mas a confecção é aprimorada, ou não fosse ele apontado como ‘o perfeccionista’. Sintetizadores apurados. Guitarras angulares. Esperança, sonhos e pop sem preconceitos. Todo o universo do músico de Leiria está espelhado neste trabalho. As coordenadas são escolhidas a dedo: Bloc Party, Franz Ferdinand e White Stripes de mãos dadas com Prince e o seu Elton John, que faz da personagem de David Fonseca ímpar em Portugal. Rising é consistente. Passa o teste do tempo e é prova da dedicação de David.

4/5

Crítica: Spoek Mathambo - "Father Creeper"

Spoek Mathambo
Father Creeper
Sub Pop Records

Depois de arrancar os ind(i)ependentes, os undergrounds e a geração grunge para as luzes da ribalta, a Sub Pop abraça também agora outras latitudes sonoras, nomeadamente uma nova sensibilidade hip hop. África é o novo centro das atenções para editoras que outrora foram bandeiras de música consumida sobretudo nos subúrbios da classe média americana. África do Sul, neste caso, é local a colocar no imaginário. Nthato Mokgata aka Spoek Mathambo é produtor/cantor que actua como "one man builder" neste Father Creeper. O segundo álbum deste construtor de paisagens tropicais põe na mesa a África profunda: as suas tribos, as suas florestas e os seus segredos. Em formas electrónicas granuladas e com o requinte de um cosmopolita. Com pés assentes no passado, mas de olhos postos no futuro da electrónica e outra vez em África, com os seus ritmos e encantos.

Sétima Legião, Três Décadas E Mais Uns Êxitos Depois

Doze anos de um tempo ausente e depois do Coliseu do Porto, “Esgotado” é a palavra que vejo estampada nas bilheteiras do Coliseu de Lisboa. O espaço prepara-se para receber dentro de minutos os regressados Sétima Legião. Em ano de reuniões – conte-se ainda os Ornatos Violeta –, há também que registar as três décadas de carreira da banda de Rodrigo Leão e companhia. Já dentro do espaço, confirmo que à espera do grupo está um Coliseu muito bem recheado. Pedro Oliveira (voz e guitarra), Rodrigo Leão (baixo e teclas), Nuno Cruz (bateria), Gabriel Gomes (acordeão e guitarra), Paulo Marinho (gaita de foles, flautas), Ricardo Camacho (teclas e guitarra) e Paulo Abelho (percussão, samplers), são os nomes de quem em breve subirá ao palco. Com o peso da idade? Veremos…
Uma rápida vista pela enorme mancha de público no Coliseu e contam-se pelos dedos, das mãos e dos pés, o número de jovens que ali foram parar. A grande maioria da legião que para este lugar rumou tem mais de 30 anos. Alguns, poucos, fazem-se acompanhar pelos rebentos. Outros vieram sem os filhos – filhos esses que talvez não tenham chegado a perceber porque é que os Sétima Legião são das mais importantes bandas portuguesas dos últimos 30 anos. Ou então estão naquela fase da adolescência em que refutam as preferências dos pais, mesmo que essas preferências musicais tenham sido influenciadas por uma das mais importantes bandas do século passado, os Joy Division. A verdade é que o conjunto de Manchester é tão importante para a compreensão dos Sétima Legião que à porta do anfiteatro recebi um flyer que indicava que nessa noite teria lugar um tributo a Ian Curtis no Metropolis. Mais uma vez, e a bem da verdade, os Sétima são, até hoje, o maior reflexo do post-punk em Portugal. No entanto, se muitos lhes apontam uma fachada étnica para disfarçar o indisfarçável, a colagem aos Joy Division, enquanto mero espectador, parti para ali sem preconceitos, com os quais já lidei ao ouvir a banda. Sei de antemão que o uso de instrumentos tradicionais da música portuguesa (gaitas-de-foles, bombos, flautas, adufes) foi um episódio despretensioso na história da banda. A introdução de elementos folclóricos trouxe-lhes uma reconhecida portugalidade sem resvalar num nacionalismo fervoroso. Os pontos cardeais dos Sétima Legião são evidentes: Manchester e Minho; e mais umas coisinhas pelo meio. Boa música, portanto.
Está tudo preparado para o começo do concerto. O atraso já é um hábito que não estranho neste tipo de ocasiões e que é aqui aproveitado para que mais gente se arrume na plateia, sentada, tal como eu. Infelizmente. O aumento da ansiedade sente-se no ar e no camarote onde estou. As luzes do Coliseu apagam-se e ainda se vê gente a entrar. No palco, o roxo toma conta do ambiente e começa o concerto. Gritos histéricos levantam-se do público enquanto um dos elementos do grupo entra em cena. Nuno Cruz, a propósito. A entrada é estonteante e o ritmo é dado pelo baterista que acaba de agradecer a paciência e a impaciência do público. “O Baile (Das Sete Partidas)” é ponto de partida para as recordações da grande maioria do Coliseu e partida para a minha primeira vez com os Sétima Legião – salvo seja. Cada um dos elementos da banda entra à vez, recebendo, cada um, um merecido aplauso de boas-vindas. A recepção de Lisboa e dos que àquele espaço se dirigiram não poderia ser maior e é contagiante. Céptico que sou – por ter apenas contacto com a música – também me deixo levar pelo entusiasmo, mas contenho-o. O calor já se sente no Coliseu e a Legião é o combustível.
O primeiro momento em que o peso da idade não se nota na voz de Pedro Oliveira traduz-se em "Noutro Lugar", seguramente um tema do Top 4 dos Sétima Legião – embora o peso da memória se note pelo pouco ensaio das letras. Sem problemas de maior, o público vai ajudando. Mas arrancar a plateia da cadeira parece ser mais difícil do que se imagina. Os aplausos são fartos e enormes, porém só em “Sete Mares” é que os crentes se levantam. Bastam alguns segundos dos sintetizadores desta música para que metade do público se levante. A outra metade demora a compreender a ‘cena’ e lá se levantam assim que Pedro Oliveira recorda que «tem mil anos uma história…». Começa a festa, com folia e fole. É nesta ocasião que vejo a fibra do público presente. O cabelo branco ou pintado é dono da grande maioria da plateia, de 30/40 anos. Um ou outro ‘barbas brancas’, com mais de 50, ainda vai pontuando a sala. Todavia, estranho dois personagens que se levantam no meio da multidão. Góticos não me parecem – o que ainda se adequava à ocasião. As t-shirts têm estampas a mais, eles têm muitas tatuagens, pouca maquilhagem e a alegria apoderou-se deles. Só podem ser metaleiros! Estranho, mas curioso. E não, eles não estão aqui por acaso. Eles cantam em voz alta a canção emblemática dos Sétima Legião! Dois fãs do headbanging a portarem-se como meninos de um qualquer clube de fãs. Felizes. A cantar. A bater palmas. E a saltar.
No palco, a festa continua. Surgem gaitas-de-foles. Muitas. E mais uns bombos. A festa está para durar noite fora, pelo menos na intenção do público que tem sede de mais. A cada nova música, de tom mais contemplativo ou de tom mais festivo, os aplausos agradecem com estrondo. Sem que muitos notem, Rodrigo Leão, no baixo ou nas teclas, troca o seu instrumento de cordas pelo de Pedro Oliveira. O primeiro fica com uma guitarra para destros, com a qual lá se entende, e o segundo com um baixo para esquerdinos, com o qual também se entrosa. Tudo corre bem e com alguma naturalidade, mas o grande erro técnico da noite bate nos ouvidos. Uma má entrada dos sintetizadores da mui ouvida “Por Quem Não Esqueci”, dá uma primeira falsa partida que poderia ter borrado a pintura toda. Num piscar de olhos é resolvida a questão, e esquecendo o tropeção de há segundos prossegue a cantada. O fim aproxima-se, e a ilusão dele dá-se.
O público quer o clímax e batendo palmas e os pés no chão, fazendo tremer literalmente o Coliseu, pede o encore. De resposta rápida surgem novamente os companheiros da memória desta noite em palco e é Ricardo Camacho quem toma conta do microfone, por segundos, para uma justa homenagem. António Sérgio, radialista falecido em 2009, recebe “Glória” como tributo. Música que é o ponto de “Partida” [lado b do single] de 1983 dos Sétima Legião. De saída novamente, o público é quem manda agora. A partir daí é arrancado o que a maioria quer: o folclore. Mais dois encores se ouvem. Sem nada de novo e com um “Sete Mares” apoteótico. A saída do Coliseu é bem servida, mas com calorias a mais. No final, o único peso é o visual – os cabelos brancos. Afinal, há uns aninhos que pelo Bairro Alto os Sétima Legião se escondiam para concertos intimistas. Sem o peso da idade.

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Crítica: "Father Creeper", Spoek Mathambo



Spoek Mathambo
Father Creeper
Sub-Pop

Em 1994, o Planeta libertava-se de um dos fardos mais constrangedores alguma vez gerados pela mão humana. A queda do Apartheid simbolizou tudo aquilo que sabemos e dela germinaram, também, novos movimentos culturais e novos artistas. A mesma semente cresceu num menino que, aos 10 anos, era fascinado pelo hip hop americano. Dezoito anos depois, Nthato Mokgata responde pelo nome de guerra Spoek Mathambo e lança agora o seu segundo álbum, Father Creeper. Um disco alucinante e fervilhante de géneros - o mesmo fervilhar que agitou a Joanesburgo da sua adolescência. Enérgico e desafiador, capta as electrónicas que agitam o mundo, mas também a herança musical sul-africana. E simboliza um avanço dos tempos: é editado pela Sub-Pop, outrora bastião do rock caucasiano (grunge, alternativo, indie, tudo isso), que agora se rende a novas linguagens: as que definem um mundo que se quer reinventar.

Crítica: Rocket Juice & The Moon



Rocket Juice & The Moon
Rocket Juice & The Moon
Honest Jon's

Pegue-se no impulso explorador de Damon Albarn, junte-se o baixo pujante de Flea e a bateria inconfundível de Tony Allen. O resultado é tão explosivo quanto a fórmula: Rocket Juice & The Moon, nome do projecto e do álbum, é puro funk e afrobeat arrancados da terra e transportados numa viagem espacial de tons psicadélicos. Erykah Badu, o rapper do Gana M.anifest e a cantora do Mali Fatoumata Diawara juntam-se à tripulação do supergrupo, acrescentam-lhe soul, hip hop e alma africana, invocam o espírito de Fela Kuti (Allen foi seu baterista) e dançam na poeira cósmica de Sun Ra. Serve a livre expressão como combustível, entre canções de formato clássico e exercícios instrumentais, em jeito de "jam session". Não parar para escutar este disco é perder uma das propostas mais cativantes do momento.

Crítica: Lisbon Bass


Vários
Lisbon Bass
Adam And Liza

Um disco vai para lá do mero registo sonoro. É um documento que cristaliza um momento da história, contada através da música. A compilação Lisbon Bass é disso exemplo, ao capturar a manifestação local de uma cultura global: a bass music à luz da cidade de Lisboa. A recolha é realizada por Rocky Marsiano (veterano da cena hip hop nacional) e Violet (da dupla de rappers A.M.O.R.). Os ritmos e as linhas de baixo são as variáveis de estudo que, combinadas entre si, incendeiam a pista de dança e reafirmam uma Lisboa multicultural, de cruzamento e miscigenação. Dubstep com kuduro, techno com kizomba, house com drum n bass, dub techno com fado. Quatorze dos melhores produtores lisboetas e um lugar que se reclama no panorama global da electrónica. Um documento valioso para os amantes da música de dança e os cientistas sociais.

Crítica: Nina Kraviz

Nina Kraviz
Nina Kraviz
Rekids

Enganem-se na suspeita: ela não tem qualquer ligação com Lenny. Nascida na Sibéria e radicada em Moscovo, Nina Kraviz é uma DJ que, nos últimos anos, conquistou lugar no circuito do "clubbing". No escuro da pista de dança e na produção, é dona de uma linguagem intrincada e sensual. A sua assinatura é agora revelada ao mundo, no álbum de estreia homónimo. Olhem para a capa e enganem-se novamente: Nina Kraviz não é mais um daqueles discos de "handbag house" polvilhado de "glitter", mas sim um exercício brilhante de técnica e emoção. Batidas cruas de deep house entrelaçam-se com atmosferas intoxicantes, minimalistas, por vezes sombrias. A sua voz emerge, sussurra, anseia, numa pista de dança quase deserta, onde a confissão oscila entre a urgência luxuriante e o eco fantasmagórico. Das pulsações dançantes ao puro “ambient”, a produção analógica confere a este disco textura e corpo. Vale a pena explorá-lo.