segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Crónica: Viva o Fado (Hoje e Amanhã)

Texto publicado originalmente na edição n.º 838 do Jornal O Povo do Cartaxo, dia 2 de Dezembro de 2011.
Confesso que este não era para ser o tema do artigo desta edição d'O Povo Do Cartaxo. Planeava voltar a questão do serviço público nos meios de comunicação, abordando agora o tema das rádios estatais, mas terá de ficar para outra oportunidade. A razão para esta alteração de planos prende-se com o todo o espectáculo criado à volta da aprovação do Fado como Património Imaterial da Humanidade. Sei que nem todos deram a mesma atenção a este importante reconhecimento - a maior parte dos noticiários continuaram a abrir com futebol - mas os que deram, fizeram-no de uma forma algo exaustiva. Não é todos os dias que vemos quase 30 minutos de um telejornal dedicados à cultura. Aliás, não tenho memória de algo semelhante ter acontecido.
Não estou, de forma alguma, a contestar a atenção dada a este acontecimento. Apenas gostaria de advertir o público para dois factores. O primeiro dos quais tem a ver com os que não deram importância alguma a este acontecimento: se algo tão tipicamente português como o Fado não interessa aos portugueses, não estou bem a ver o que interessará. Sabemos bem como funciona o jornalismo televisivo em Portugal. Por um lado, há espaço na grelha para um telejornal com quase duas horas de duração, mas dentro do próprio telejornal não há espaço para um bloco de notícias culturais digno desse nome, nem para mais notícias de desporto que não futebol. O recado serve também para os que no fim-de-semana passado fizeram uma cobertura exemplar do acontecimento, para que não adormeçam à sombra de um bom momento e continuem a falar de cultura sem a arrumarem para um canto no final do telejornal, como se de um assunto menor se tratasse.

Decerto compreendem e partilham da minha surpresa, não é normal passar-se tanto tempo a falar de algo que realmente interessa e nos leva a algum lado. A falta de hábito dos portugueses no que toca a encontrar cultura nos meios de comunicação não especializados leva-me ao segundo ponto: o Fado ser Património da Humanidade, só por si, não vale nada. Há cerca de um ano era o Flamenco que estava na posição do Fado e, já hoje, alguns membros da comissão que prepararam a sua candidatura desejavam melhor sorte aos portugueses como património Imaterial da Humanidade. Refira-se ainda que o Flamenco tem feito um esforço no sentido da modernização, quer seja por conta própria ou por fusão com outros estilos. O Fado, convenhamos, não mudou assim tanto e as fusões que têm surgido a conta-gotas são previsíveis e pouco arrojadas. Ou seja, há que promover agora o Fado como património da humanidade, caso contrário sete anos da vida dos autores da candidatura podem ficar comprometidos.

Nos últimos dias pode-se ter ouvido falar muitas vezes em Fado, mas se o deixarmos cair no esquecimento, tanto faz que seja património da humanidade ou património do gado bovino. Cabe a nós público e aos meios de comunicação, fazer "propaganda" a este nosso produto. E, provavelmente, é o melhor momento para o fazer, já que estamos num período de popularidade do Fado só equiparável a outro acontecido algures antes do 25 de Abril.
Ao contrário do que muitas mentes retrógradas pensam, a música não é só entretenimento. É também parte da história dos povos e, sendo assim, o Fado conta uma grande parte da história dos portugueses. Resta-me dar os parabéns aos autores desta candidatura e a todos os que ajudam a levar o Fado, a língua e música portuguesas além fronteiras. O trabalho começa agora.

Sem comentários:

Enviar um comentário