terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Crónica: 80 < 90

Texto publicado originalmente na edição n.º 833 do Jornal O Povo do Cartaxo, dia 23 de Setembro de 2011.
Faz amanhã, dia 24 de Setembro, 20 anos que foi lançado um álbum que revolucionou a indústria musical mundial. Falo do disco Nevermind dos Nirvana, banda de Seattle (E.U.A.), responsável por uma das grandes viragens na música no século passado, revolução que ecoa ainda nos dias de hoje. "Smells Like Teen Spirit", em particular, música presente no disco em questão, é «A» música deste disco e de uma era; fora dos formatos da pop/rock da altura dominante, de cabedal e cabelos platinados, e de espírito declaradamente underground, traz consigo todas (ou quase) as bandas de garagem para a ribalta. Por impossível que possa parecer foi responsável pelo aparecimento e criação de inúmeras bandas que poderiam também sonhar com o sucesso a partir daquele momento, daquele lançamento, e é também responsável pela criação de diversos e dispersos formatos de alto consumo de canções fora do formato pop reinante. A pop continuava a reinar mas outras linguagens surgiam com tanta ou mais força. A isto tudo junta-se o mito: Kurt Cobain, líder dos Nirvana, que tinha uma voz declaradamente limitada, mas peculiar, surge numa imagem fora dos parâmetros normais de estrela pop; torna-se no último grande “herói” do rock mundial também com um alegado suicídio, em 1994, que põe todo o sucesso alcançado num patamar ainda mais alto, bem como ajuda a criar um mito para a eternidade, escrito nas páginas da história da música mundial popular. 1991 marcou definitivamente o mundo da música, com grande destaque para este disco; não só a sua música - foi e é algo maior para além disso.
Aproveito então esta efeméride, e numa altura em que está na calha o lançamento de diversas reedições de luxo deste disco (DVDs, raridades, caixas especiais, edições limitas…) para rejubilo de muitos que viveram aquela época com os seus próprios olhos, para dissecar um assunto: será a década de 80 a melhor da música? Nas seguintes linhas farei por clarificar o meu pensamento.
Hoje as pessoas que viveram intensamente o tempo dos Nirvana, de Seattle e toda a década de 90 terão 30 ou mais anos, ou seja isto corresponderá, se a sociedade assim o proporcionou naturalmente, a um maior poder económico para essas pessoas na actualidade – regra geral. Isto significa que hoje essas pessoas tem capacidade financeira para coleccionar, consumir e ouvir o material e a música da sua adolescência, do seu tempo – a década de 90. Com isto quero afirmar que a partir de agora, aos poucos e poucos, será a década de 90 a melhor década da música, como é óbvio observar. Tudo porque a indústria musical vai potenciar as suas forças para este novo “nicho” (note-se o eufemismo) que tem agora poder financeiro para comprar as bandas sonoras da sua juventude.
Não falo só de Nirvana e das bandas à volta desta que despontaram da música underground a partir de 1991, falo também de toda a década de 90, com tantos outros grandes nomes da pop (boys e girlsbands, as Britney Spears entre outros(as)); o hip-hop e o seu exponencial crescimento; o metal, os seus congéneres e as fusões de metal com hip-hop; a electrónica; a eurodance; o tecno e a disco sound da mesma década. Todo o foco e poder financeiro vão estar, nos próximos tempos, virado para aqueles anos.
É, e sempre será assim. Quando uma nova década começa, uma nova geração, que acaba de adquirir poder financeiro, começa a moldar, a dar as coordenadas e as direcções (onde está o dinheiro, entenda-se) para toda a indústria musical de forma a que esta forneça aquilo que esta nova geração quer ouvir. É a lei normal da passagem do tempo, ganha quem pode, e será a década de 90 a melhor daqui adiante.
Agora, caro leitor, da próxima vez que lhe perguntarem qual é a melhor década da música reflicta bem. A década de 90 está prestes a reinar durante uns 10/15 anos e certamente que em 1976 ninguém reconheceria a década de 80 como a melhor da música. Sei que eleger a década 90 como a melhor da música é pura subjectividade, tal como nomear a de 80, a de 70 e por aí adiante; mas conformemo-nos e desfrutemos da década que irá dominar nas nossas rádios, seguir-se-ão outras a seguir a esta.
Alguém pediu o regresso dos anos 90?

4 comentários:

  1. É dos 90's que "todos" esperamos!!! =)
    Não sei se foi uma década superior à década de 80(claro que foi), mas muito provávelmente foi a ultima década do "rock e derivados", a estabelecer com expressão as diferenças de idêntidade entre gerações.
    Não foram os Nirvana que começaram a marcar esta barreira é certo, os Pixies, os Sonic Youth, Melvins, ou Mudhoney já existiam e os próprios Nirvana sempre fizeram referência a esse pequeno (grande) pormenor... mas sem dúvida que foram os Nirvana a ter o impacto e a dimensão popular que as "minorias" há tanto esperavam.
    Negaram as "popas" dos sintetizadores dos Depeche Mode, os floriados da "permanente" do Jon Bon Jovi, a meia branca do Jackson e as "birras" dos calções de licra do Axl... isto até à Madonna ter percebido que afinal não era nada "like a virgin"!!!
    Desceram à terra e deram a perspectiva "humana" que faltava ao mundo "cor-de-rosa" dos 80... "isto não é perfeito, também é feio, sujo e natural"!!!
    Puseram os "betos" a ouvir "Punk" e o Tupac a afirmar que qualquer dia dava um tiro na cabeça como o Kurt Cobain. Desenvolveram uma nova visão à Pop e tiraram algum Metal da cave.
    1991 por exemplo, foi um ano de grandes álbuns... além de Nevermind obviamente, o que dizer do Ten dos Pearl Jam, Achtung Baby dos U2, Black Album dos Metallica, ou a própria estreia de Tupac Shakur.
    Para os miúdos com 18 anos os 90's hoje são a "old school", para os tais com 30 e mais anos, os 90's foram a sua "school".
    Podem até não ter apresentado nada de novo a nível músical (o que até apresentaram...nasceu o Grunge...sendo esse género lá o que for)... mas foram um grande exemplo de que todas as gerações têm uma idêntidade e que essa idêntidade tem que ser afirmada.
    Tal como o Rui Miguel Abreu nos passou a mensagem numa das suas aulas, não é por ouvirmos o Marilyn Manson que vamos deixar de ir "à praia"... não é por se ouvir um "Gangster" no Hip Hop que vamos comprar uma arma... faz tudo parte de uma consciência e não é esse o objectivo enquanto referências.
    Que voltem as referências perdidas neste "excesso de informação" e "espírito consumista" na diversidade abusiva que nos persegue... e alguém pediu o regresso dos 90?

    Well Done Carlos!!! =)

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  2. Grande testamento ó Hugo!

    Não queria dizer no artigo que a década de 90 é melhor que a de 80, apenas que vai mudar. O tempo faz com que as décadas "da melhor música" se vão alterando. É a evolução normal da coisas.

    P.S: Mas sim, a década de 90 é boa!

    Obrigado Hugo.

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  3. Sim, eu percebi a tua ideia no artigo!!! =)
    Este testamento foi mesmo na óptica de leitor, que aproveitei para dar a minha ideia "à vontade" sobre as duas épocas, pegando em alguns pontos que tu referiste no teu artigo. =)

    Abraço

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